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O mal-entendido que culminou com a queda do Muro de Berlim




Em 9 de novembro de 1989, Günter Schabowski disse que os alemães-orientais eram livres para partir, imediatamente. E não era bem isso. 



Nós frequentemente pensamos na história como sendo de alguma forma inevitável a culminação de grandes forças geotectônicas triturantes. O que pensar então de Günter Schabowski, que morreu em 2015 aos 86 anos. Poucas pessoas marcarão o falecimento deste agente improvável do destino, que fez história na Guerra Fria com um dar de ombros.

Era o anoitecer de 9 de novembro de 1989. Poucas semanas antes, um grupo de reformistas do Partido Comunista derrubou o chefe linha-dura da República Democrática Alemã, como era conhecida a Alemanha Oriental por trás da Cortina de Ferro. Diante dos protestos em massa em Dresden, Leipzig e Berlim, eles buscavam projetar uma nova face de mudança. E naquela noite, Schabowski, um funcionário obscuro, se tornou essa face e mudou o mundo de uma forma altamente improvável.

A queda dramática do infame Muro de Berlim, símbolo das cinco décadas de Guerra Fria, se desenrolou quase como uma farsa. Ela começou no início de noite em que Schabowski, recém-nomeado como porta-voz do Partido Comunista, cruzou com seu chefe a caminho de sua coletiva de imprensa diária, por si só uma inovação para os comunistas sigilosos e que tudo controlavam.

"Algo para anunciar?" ele perguntou casualmente. O chefe do partido, Egon Krenz, pensou por um instante, depois entregou a Schabowski um memorando de duas páginas. "Pegue isto", ele disse com um sorriso. "Isto nos fará bem."

Schabowski checou o documento em sua limusine. Parecia simples: um memorando de legislação que seu chefe forçou um Parlamento relutante a aceitar naquela tarde, que daria aos alemães-orientais o direito de viajar ao Ocidente e ao fazê-lo, transformar o novo regime em heróis do povo. Na coletiva de imprensa, ele o leu como item quatro ou cinco de uma lista de anúncios diversos. Tinha a ver com passaportes. Agora todo alemão-oriental, pela primeira vez, teria direito a um. Eles poderiam ir para onde quisessem, incluindo o Ocidente.

Para uma população presa há tanto tempo atrás da Cortina de Ferro, foi uma notícia momentosa. Houve um súbito silêncio, então uma onda de murmúrios animados. Schabowski prosseguiu falando monotonamente. Do fundo da sala, enquanto as câmeras transmitiam ao vivo para o país, um repórter gritou a pergunta fatídica. "Quando entrará em vigor?"


Schabowski fez uma pausa, levantou os olhos, repentinamente confuso. "O quê?"


O coro de perguntas recomeçou. Schabowski coçou sua cabeça, cochichou com assessores de ambos os lados, ajeitou os óculos na ponta do nariz, folhou seus papéis e levantou de novo os olhos e deu de ombros. "Ab sofort", ou seja, imediatamente. Sem demora.


Com isso, a sala (e o mundo) entrou em erupção. Nós agora sabemos que Schabowski em grande não percebeu o terremoto que suas palavras causaram. Na verdade, ele tinha voltado de breves férias naquele dia. Ele não sabia que as novas regras deveriam entrar em vigor no dia seguinte, 10 de novembro sujeitas a todo tipo de letras miúdas, incluindo a necessidade de obtenção de vistos. Os alemães-orientais também não sabiam. Todos só sabiam o que tinham ouvido no rádio e na TV. Graças a Schabowski, eles acharam que estavam livres para ir. Imediatamente.

Às dezenas de milhares, em uma maré humana não diferente daquela que varre a Europa hoje, as pessoas convergiram ao Checkpoint Charlie e outros pontos de travessia para Berlim Ocidental. Surpresos e sobrecarregados, não tendo recebido instruções e sem saber o que fazer, a polícia de fronteira alemã-oriental agiu por conta própria. Como Schabowski, ela deu de ombros e abriu os portões para a liberdade. E assim o Muro de Berlim caiu.

O que pensar, então, da ação improvável de Schabowski? Um "erro crasso", como seu chefe chamou zombeteiramente depois, que em poucos meses derrubaria não apenas a Alemanha Oriental comunista, mas todo o império soviético.

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